George R. R. Martin admite que também queria mais episódios de "Game of Thrones"

A cultura tem uma queda pelos escritos de George R. R. Martin atualmente, especificamente por seu grande sucesso As Crônicas de Gelo e Fogo, série que é a inspiração por trás de Game of Thrones, programa da HBO que estourou e cuja quarta temporada terminou em junho.

Mesmo com todo esse sucesso há certa tensão entre a interpretação do sonho do Thrones da HBO e a do de Martin. Game of Thrones tem em média mais de 18 milhões de espectadores por episódio, e essa temporada ultrapassou Família Soprano como a série mais assistida da HBO. Com esses números, os Stark e os Lannister, os Baratheon e os Targaryen não pertencem mais somente a Martin.

Com a série atingindo esses picos de audiência e atraindo críticos afiados nesta temporada, Martin concordou em falar a respeito do que a série acertou até então, do que ficou faltando e de onde residem suas paixões. E ele foi capaz de fazer essas observações a partir de um raro ponto de vista de um escritor que realizou extensivos trabalhos para a televisão e que publica romances de sucesso.

Em uma recente entrevista concedida por telefone, ele disse não ter achado tão difícil transpor a série para a televisão "porque eles fizeram um trabalho maravilhoso", referindo-se à equipe de Game of Thrones, liderada por David Benioff e D.B. Weiss, que criaram a série para a HBO. Mas há uma coisa que deixaria Martin muito feliz.

Sendo uma pessoa de imaginação épica, povoada por centenas, se não milhares, de personagens vívidos, lhe agradaria se sua criação tivesse mais liberdade na HBO, em que cada temporada tem apenas 10 capítulos.
– Eu gostaria que tivéssemos mais episódios. Eu adoraria que houvesse 13 episódios. Com essa quantidade poderíamos incluir cenas secundárias que tivemos que cortar, cenas que tornam a história mais profunda e rica – disse ele, de sua casa em Santa Fé, no Novo México.
Contudo, ele compreende o cálculo do orçamento. Com cenas filmadas em destinos longínquos – Islândia, Irlanda do Norte, Malta, Croácia, Marrocos – e todas aquelas extensas, mas essenciais batalhas, uma temporada de Thrones custa entre US$ 60 milhões e US$ 70 milhões.
– Batalhas são caras – disse Martin, que trabalhou na TV nos anos 80, com um tom de resignação de veterano em sua voz.
Martin, que publicou seus contos primeiramente em revistas de ficção científica nos anos 70, sempre se viu como um escritor de ficção científica antes de tudo, e o universo dos livros lhe cobriu de honras, incluindo os prêmios Hugo, Nebula, Stoker e World Fantasy.
– Me dou melhor trabalhando sozinho do que colaborando – disse ele.
Apesar disso, ele certamente colaborou quando trabalhava na televisão, como editor de histórias para The Twilight Zone, na CBS, em 1986, e escritor e produtor para A Bela e a Fera, que estreou na CBS em 1987. Mas "havia certa frustração", disse ele. Como escritor, ele se preocupa mais com:
– Como posso tornar isso melhor, mais forte? Qual a palavra mais certeira para usar aqui? Eu quero a palavra final. Cansei de lutar aquela luta secundária, a equação de poder de Hollywood.
E continuou:
– Se eu não gosto de alguma das sugestões da Anne (sua editora na Bantam Books, Anne Groell) apenas não a aceito. Na TV você tem o network, o estúdio sobre você, como Zeus nos céus.
Ele então desistiu da TV e retomou o romance, começando a sua saga Gelo e Fogo em 1991, determinado a deixar a história conduzi-lo para onde ela quisesse, fazendo a jornada de volta a suas paixões criativas iniciais. Na série, Martin esteve bastante ativo e escreveu muitas páginas – por volta de 5 mil ou mais –, começando em 1996, quando A Game of Thrones foi publicado. Ainda que possua muitos elementos de fantasia, em diversos pontos é mais como um romance épico do século 19 com filigrana fantasiosa, mais pra Tolstoi do que pra Tolkien. Martin disse que jamais pensou que a história pudesse ser ajustada à TV.

E há aqueles que se deleitariam se a série não tivesse ido pra HBO. Com sua popularidade crescente, alguns críticos reclamaram sobre as cenas que contêm violência sexual. Mas Martin disse que era impossível que esse aspecto não existisse nesse mundo.
– Estupro e violência sexual foram parte de todas as guerras que lutamos, dos sumérios antigos aos dias atuais. Omiti-los de uma narrativa centrada na guerra e no poder teria sido fundamentalmente falso e desonesto – disse ele ao The New York Times em maio, por e-mail.
Mas Martin foi rápido em dizer em sua entrevista mais recente que seu papel relacionado à série da HBO é secundário. Ele é coprodutor executivo e escreveu um episódio por temporada. Disse tentar não se afligir com as versões para a televisão.
– Mas pequenas mudanças podem levar a grandes mudanças.
Peguemos o caso do músico Marillion, da primiera temporada. Na HBO, Marillion é mutilado – sua língua é cortada fora – por um capricho do Rei Joffrey e em seguida ele deixa a série. Isso não acontece nos livros, onde ele figura como bode expiatório no assassinato de Lysa Arryn, cometido por Lorde Petyr Baelish (mostrado nesta temporada na HBO).
– Isso teve que ser modificado. Os efeitos-borboleta estão se acumulando – disse Martin sobre o assassinato.
Mas e quanto ao seu sonho, sua visão? Teriam sido supridos pela HBO? Ele disse ter ficado satisfeito sobretudo com o figurino, o design dos cenários e os efeitos especiais. Se tivesse se envolvido mais, disse, haveria ajustes. "Não, não, vamos fazer o elmo dessa forma".

Mas há um elemento crucial que o frustra: a representação do cruel e monumental Trono de Ferro. "O trono da HBO se tornou icônico", escreveu ele em seu blog. "E com razão. Ele tem um design espetacular, e caiu muito bem na série. Há réplicas e pesos de papel em três tamanhos diferentes. Todo mundo sabe disso. Eu adoro. Tenho todas essas réplicas aqui nas minhas estantes".

Mas, continuou: "Não é o Trono de Ferro que eu visualizo quando estou trabalhando em Os ventos de inverno. Não é o Trono de Ferro que quero que meus leitores visualizem. A forma como o trono está descrito nos livros... IMENSO, elevado, negro e distorcido, com os degraus íngremes de ferro à frente, o assento alto, de onde o rei olha PARA BAIXO para ver todos na corte... meu trono é uma besta encurvada iminente na sala do trono, feia e assimétrica... O trono da HBO não é nada disso".

O sucesso de Thrones na TV tornou Martin uma espécie de celebridade. Um homem com a corpulência e a alegria de um hobbit, ele não é o tipo de figura clássica do estrelato da cultura pop.
– Tem sido surreal. Você sempre espera pelo sucesso, mas as coisas foram pra um outro nível, o de ser uma celebridade, que é algo fugaz – disse durante a entrevista.
Famoso ou não, Martin ainda é obrigado a se sentar todos os dias e escrever porque milhões de fãs agitados estão esperando, achando que o "Inverno" está chegando – em breve. Ele está escrevendo muito devagar para o gosto de alguns fãs, mas qualidade leva tempo. Quando perguntado sobre seu progresso em Os Ventos de Inverno, tudo o que Martin diria, com um suspiro em sua voz, seria "está caminhando".

Foi o suspiro de um bom sonhador.
Fonte:zh.clicrbs
Proxima
« Anterior
Anterior
Proxima »